Quase seis mil meninas de 10 a 14 anos deram à luz na Bahia vítimas de estupro de vulnerável

Número de partos supera o de registros oficiais de violência sexual; apenas 0,9% das vítimas tiveram acesso ao aborto legal

Quase seis mil meninas com idades entre 10 e 14 anos deram à luz na Bahia nos últimos cinco anos, segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado (Sesab). Pela lei brasileira, toda gravidez nessa faixa etária é resultado de estupro de vulnerável, já que não há consentimento possível. No entanto, o número de registros oficiais de violência sexual nesse mesmo grupo é menor: pouco mais de 3,9 mil casos.

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O levantamento revela que a maioria das meninas não é tratada como vítima de crime, muitas vezes por não saber que sofreu uma violação. Ainda mais grave é o dado sobre o aborto legal: entre 2021 e 2025, apenas 55 crianças realizaram o procedimento, o que corresponde a 0,92% das 5.939 gestações.

“A realidade é que a grande maioria nem chega ao serviço. Se uma menina com menos de 14 anos está gestante, é porque foi estuprada”, afirmou a psicóloga Fabiana Kubiak, da Área Técnica de Atenção à Pessoa em Situação de Violência Sexual da Sesab.

A situação se agrava com a aprovação de um projeto de lei na Câmara dos Deputados, que suspende uma resolução do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) que garantia o acesso à informação e ao aborto legal sem necessidade de boletim de ocorrência ou autorização judicial. O texto agora segue para o Senado Federal.

Especialistas e entidades, incluindo o Ministério das Mulheres, alertam que a medida pode dificultar ainda mais o atendimento de vítimas de estupro infantil, principalmente as mais pobres e do interior.

Segundo a Sesab, 88% das meninas que engravidaram após estupro são negras. Fabiana Kubiak explica que, em muitas comunidades, relações entre adultos e meninas são vistas com naturalidade, o que mascara os casos de violência.

“Escutamos que a menina está morando com o cara, e muitas vezes ela é responsabilizada. É a naturalização do abuso”, afirma a psicóloga.

Dados do IBGE reforçam o cenário: a Bahia é o segundo estado do país com mais meninas vivendo em uniões conjugais — mais de 2,7 mil entre 10 e 14 anos.

Poucas chegam aos serviços especializados

Na Maternidade Climério de Oliveira (UFBA), única unidade do estado que realiza aborto legal após 22 semanas, o programa Apoiar registrou mais de 200 atendimentos desde 2021, mas apenas 22 eram de crianças de até 14 anos.

“Muitas descobrem a gestação tardiamente ou nem descobrem. Quando chegam, já estão com quase 20 semanas”, relata a psicóloga Leila Costa.

A maioria dessas meninas é vítima de violência contínua, muitas vezes dentro de casa, cometida por pais, padrastos ou parentes próximos.

Futuro incerto

Com o risco de revogação da resolução do Conanda, especialistas temem aumento da subnotificação e da violência institucional. O governo baiano promete lançar até 2026 um protocolo intersetorial para garantir acolhimento e informação às vítimas, mas enquanto isso, milhares de meninas seguem sendo mães forçadas pelo crime e pelo silêncio.

 

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