Romance escrito por Amélia Rodrigues é editado em livro 140 anos após a publicação em jornal

Sessenta e cinco anos de vida foram poucos para dar conta do tamanho da produção de Amélia Rodrigues (1861-1926). Única baiana a nomear uma cidade na Bahia (com exceção de Santas), a obra da santoamarense foi extensa e ultrapassou a própria área da educação, na qual foi devota e ativista. Teatro, prosa, poesia e diversos tipos de narrativas passaram pela tinta, caneta e papel da professora.
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Um bom exemplo é o romance O Mameluco, publicado em fascículos no século XIX, mas que permanecia desconhecido do grande público. Mas um projeto assinado pela também professora Milena Britto, do Instituto de Letras da Ufba e selecionado pelo Rumos Itaú Cultural, proporcionou a primeira edição em livro do texto.
O lançamento será nesta terça (21/6), às 17h, com uma conversa reunindo Milena, a pesquisadora Constância Lima Duarte, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e Nancy Vieira, professora e pesquisadora do Instituto de Letras da Ufba no YouTube da livraria Boto-cor-de-rosa.. Elas conversam sobre a publicação e sobre o trabalho de Amélia Rodrigues, que virou nome de cidade 35 anos após a sua morte – quando o distrito de Traripe foi emancipado de Santo Amaro, marcando o centenário da autora.
Debate racial
O enredo de O Mameluco trata de debates raciais da época, como a mestiçagem no país, ecoando a questão da nacionalidade brasileira e a sua formação racial. Tudo isso dentro de um enredo que envolve um triângulo amoroso, senhores de terras, pessoas negras escravizadas, coronéis e o envio arbitrário de soldados e civis à Guerra do Paraguai – pano de fundo da trama.
A história ambientada em uma fazenda do Recôncavo baiano foi publicada em um folhetim no ano de 1882. Movida pela curiosidade, a ainda estudante Milena vasculhou o setor de periódicos raros da Biblioteca Central dos Barris até encontrar a publicação original.
“É interessante falar que este trabalho não está tão acessível e se não fosse pelo investimento de pesquisadoras que acionam outros lugares, cavando, pensando em histórias ocultas… não sairia. Essa história vem de uma motivação de complementar dados históricos sobre a produção baiana, considerando a voz da mulher baiana do século XIX”, afirma a autora.
O periódico em questão é o extinto jornal Echo Sant’Amarense, um dos principais do Recôncavo no século XIX. Para o livro, o texto foi resgatado do último exemplar sobrevivente do ano de 1882 do periódico, arquivado no acervo da Biblioteca do Estado da Bahia. A edição vem acompanhada de ilustrações de Flávia Bomfim, criadas exclusivamente para o romance, que integra a coleção Escritoras das Américas.
A artista faz algumas releituras de imagens conhecidas da arte e cultura pop brasileiras e apresenta as personagens interpretando-as a partir da visão daquele momento, chamando atenção sobre os estereótipos também presentes na iconografia brasileira.
“Através dessas produções a gente se deparou com a figura de Amélia Rodrigues, que é nome de cidade, conhecida como pedagoga, professora, até o século XX a morte dela sempre era lembrada nos jornais. A gente sabia do vínculo com a Igreja Católica, as revistas feministas, mas a produção literária ficava perdida”, explica Milena Britto.
Uma das curadoraras da edição deste ano da Festa Literária de Paraty – Flip, Milena explica que o livro de Amélia Rodrigues é um marco na literatura sobre a formação racial do país e mostra como a história da Bahia é  complexa: o Recôncavo era um dos ambientes mais conservadores do Brasil, resistente a todo tipo de ideia progressista da época, como a abolição da escravatura e industrialização, por exemplo. Ainda assim, tinha no seio de sua sociedade uma mulher, letrada e escritora.
Um pouco da pesquisa de Milena está detalhada no ensaio Amélia Rodrigues e a Escrita das Mulheres do Século XX, que está na edição.
Origem humilde
Estudos mais recentes indicam que Amélia Rodrigues sequer era uma mulher herdeira de grandes posses. Na verdade, veio de uma família humilde. Nasceu na Fazenda Campos e sua educação formal se deve à familiares ligados à Igreja Católica.
“Amélia começa a escrever muito jovem, publica poemas, passa num concurso para professoras e vem pra Salvador. Continua as publicações, tanto de livros quanto em jornais. Ela funda também as escolas mistas, para meninos e meninas, porque tinha a preocupação que as meninas tivessem acesso aos estudos”, pontua Carline Silva, professora e doutora em História, que elabora um livro biográfico sobre a educadora.
Reconhecida na alta sociedade, trocava cartas com governadores, arcebispos e jornalistas, reivindicando melhorias para os projetos aos quais estava à frente, bem como interesses comuns da cidade. Em uma destas enérgicas missivas pede —e consegue— que JJ Seabra (1855-1942) intervenha contra a demolição do Mosteiro de São Bento.
FICHA
Livro: O Mameluco
Autora:  Amélia Rodrigues
Editora:  paraLeLo13S
Quanto: R$ 82,90 (220 páginas), à venda no site da Livraria Boto Cor de Rosa

 

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Correio 24horas

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